Antes da fama, dos milhões e da NBA, existiam quatro garotos em quadra: LeBron, Dru, Willie e Sian. Shooting Stars (2023), dirigido por Chris Robinson, é menos sobre estatísticas e mais sobre as decisões que definem caráter. A produção não se contenta em contar a origem de um ícone do basquete — ela revela como o coletivo moldou o indivíduo e como o talento, quando dividido entre amigos, vira elo, não obstáculo.
Akron, amizade e começo de tudo
Situado no coração operário de Akron, Ohio, o filme remonta à infância de LeBron James e seus amigos, conhecidos como “Shooting Stars”. Mais do que uma história de superação, trata-se de um relato sobre como o esporte se transformou em linguagem afetiva entre adolescentes em busca de direção. A infância dura, marcada por desigualdades estruturais, é retratada não como tragédia, mas como combustível para o sonho.
Entre partidas improvisadas, discussões intensas e abraços silenciosos, o longa mergulha na formação de um grupo que não apenas jogava junto, mas escolhia ficar junto. As quadras são o cenário, mas o foco está nos bastidores da convivência: onde se aprendem limites, confiança e resiliência — uma educação que não vem da escola formal, mas da vivência em comunidade.
Quando o talento desafia a união
À medida que LeBron desponta como fenômeno natural, os laços entre o grupo são postos à prova. A admissão em St. Vincent-St. Mary, escola católica tradicional, simboliza não apenas um passo rumo ao estrelato, mas também uma ameaça à coesão do grupo. O filme aborda esse dilema com sensibilidade: como permanecer fiel ao time quando o destino aponta para caminhos individuais?
Os conflitos não são ignorados. Eles emergem nas festas fora de hora, nas pequenas traições emocionais e no peso de decisões adultas em corpos adolescentes. No entanto, Shooting Stars não se rende ao drama fácil. Ele mostra que o verdadeiro desafio não é vencer uma partida decisiva — é manter a integridade quando tudo ao redor convida à ruptura.
O time além da estrela
Embora o título carregue o nome de LeBron, a estrutura narrativa do filme insiste em um plural. E essa escolha faz sentido. Caleb McLaughlin, como Dru Joyce III, oferece o contraponto emocional necessário: menos explosivo, mas mais estável, mais contido, mas profundamente humano. Sua presença equilibra o carisma físico de Mookie Cook, que interpreta LeBron com dignidade, ainda que sem aprofundar as camadas internas do ídolo.
O elenco de apoio — formado por Khalil Everage, Avery Wills Jr. e Scoot Henderson — não serve como figurante da trajetória de um herói, mas como coluna vertebral da história. Cada personagem tem tempo de tela e relevância, reforçando o argumento central: antes de ser um astro, LeBron foi parte de algo maior — uma fraternidade em movimento.
O estilo que respira juventude
Visualmente, Shooting Stars aposta em um dinamismo narrativo que combina técnicas modernas com uma estética nostálgica. Câmeras aéreas, cortes rápidos e o uso de proporção 4:3 nas memórias antigas criam um ritmo pulsante que traduz o frenesi da juventude. A divisão por capítulos ajuda a tornar a narrativa episódica, quase como um diário visual dos passos dados rumo ao desconhecido.
Esse estilo reforça o tom emocional da obra. Mais do que captar cestas e placares, a câmera parece interessada em olhares, silêncios e gestos miúdos — elementos que constroem o verdadeiro drama da adolescência. O esporte, nesse contexto, é um catalisador narrativo, não o destino final.
O preço da glória e os silêncios da narrativa
Apesar dos méritos visuais e da honestidade emocional, o filme não escapa de críticas. Algumas tensões — como a suspensão escolar de LeBron ou os atritos internos do grupo — são resolvidas com rapidez, comprometendo a densidade dramática. Há também a sensação de que o roteiro evita mergulhar nos aspectos mais controversos da ascensão precoce do protagonista.
Comparado ao documentário More Than a Game, Shooting Stars é menos incisivo. Em vez de aprofundar a psicologia dos personagens, prefere amplificar momentos já conhecidos do público. Ainda assim, a obra cumpre seu papel como relato de formação: um coming-of-age esportivo que, mesmo previsível em certos pontos, emociona pela autenticidade.
Sonhar em conjunto: a verdadeira vitória
Shooting Stars integra uma leva recente de cinebiografias esportivas que valorizam o percurso tanto quanto o destino. Mais do que uma história de LeBron James, é um filme sobre meninos negros da periferia que escolheram permanecer juntos, mesmo quando o mundo dizia que era hora de seguir caminhos separados. Um pacto que, ao fim, tornou-se a semente de uma lenda.
Na base dessa narrativa está a ideia de mobilidade social construída coletivamente — não por mérito isolado, mas por redes de apoio, sacrifícios mútuos e sonhos compartilhados. É um lembrete de que, em muitos contextos, a maior conquista é manter-se fiel às origens e às pessoas que estiveram ao seu lado quando o futuro ainda era só uma aposta.
