Lançado em novembro de 2024, Herege (Heretic), dirigido e roteirizado por Scott Beck e Bryan Woods, coloca duas jovens missionárias frente a frente com um manipulador carismático, vivido por Hugh Grant. O filme constrói, dentro de um espaço restrito, um suspense religioso inquietante que questiona até onde a fé é força ou fraqueza — e como o poder pode se disfarçar de promessa.
Um jogo de palavras e poder
No coração de Herege, não há sustos gratuitos ou efeitos exagerados, mas um duelo verbal intenso. Mr. Reed, interpretado com precisão por Hugh Grant, transforma cada frase em armadilha, conduzindo as missionárias Sister Barnes (Sophie Thatcher) e Sister Paxton (Chloe East) a um labirinto psicológico. Nesse território, o que se diz é tão perigoso quanto o que se oculta, e a atmosfera claustrofóbica faz do espectador um cúmplice silencioso.
O filme constrói sua tensão de forma teatral, onde a proximidade física e o confinamento espacial amplificam o terror emocional. Essa escolha narrativa aproxima a obra de peças de câmara, em que o foco não está no espetáculo visual, mas na dissecação das relações de poder e vulnerabilidade humanas.
Fé, controle e o fascínio do manipulador
Beck e Woods colocam em xeque o que significa acreditar. Aqui, a fé não surge como um porto seguro, mas como um terreno instável que pode ser explorado por quem domina a linguagem e as emoções. O carisma de Mr. Reed é sedutor e repulsivo na mesma medida, revelando como líderes, ideologias ou figuras de autoridade podem capturar mentes e corações com gestos sutis.
Essa dinâmica ressoa com dilemas contemporâneos, onde crenças — religiosas, políticas ou sociais — tornam-se moeda de troca em disputas silenciosas pelo controle. O filme provoca o público a observar como o fanatismo não precisa de multidões para nascer; basta um encontro intenso e a vulnerabilidade de quem está disposto a ouvir.
A estética do terror silencioso
Herege se diferencia no cenário do horror psicológico atual por rejeitar o barulho e abraçar o silêncio como recurso narrativo. Cada pausa, cada olhar e cada respiração entre as falas carrega o peso da ameaça. A trilha sonora minimalista e a iluminação contida criam uma atmosfera de isolamento quase sufocante, reforçando a ideia de que, às vezes, o maior medo vem do que não é dito.
O resultado é uma obra que convida mais à reflexão do que à catarse. Ao final, não há respostas fáceis nem alívio completo — apenas a inquietante sensação de que, em qualquer porta que se bata, pode haver alguém pronto para reescrever sua crença.
