Dirigido por Amanda Kernell, Sangue Sámi acompanha Elle-Marja, uma jovem indígena enviada a um internato sueco para povos nativos, onde é submetida a estudos pseudocientíficos e segregação. Entre o desejo de ser aceita e a pressão de negar suas origens, Elle-Marja descobre que a liberdade muitas vezes exige um preço emocional elevado — e que o sangue que corre em nossas veias não se apaga facilmente.
Racismo e colonialismo interno
O internato sueco funciona como palco da violência estrutural contra os povos sámi, com estudos pseudocientíficos e humilhações cotidianas que visam inferiorizar e “normalizar” os alunos indígenas. Elle-Marja se vê obrigada a confrontar a realidade de sua cultura, enquanto observa colegas e professores reproduzirem preconceitos e hierarquias impostas pelo Estado.
Essa assimilação forçada é um reflexo do colonialismo interno: o Estado impõe regras para apagar identidades e criar cidadãos “aceitáveis”, ao custo de destruir laços familiares e culturais. O filme evidencia como políticas de exclusão, mesmo em contextos escolarizados, podem marcar vidas inteiras, moldando escolhas que carregam culpa, vergonha e arrependimento.
Identidade e pertencimento
Desejando ser aceita, Elle-Marja decide abandonar sua língua, suas tradições e até seu sobrenome, tentando viver como sueca. Cada conquista pessoal vem acompanhada de perda, incluindo a relação com sua irmã Njenna e com sua própria história. A alternância entre juventude e idade adulta mostra o peso dessas decisões, revelando que a negação de si mesmo é um fardo que se prolonga pela vida.
O filme explora a tensão entre pertencimento e liberdade, questionando se a autonomia pode ser verdadeira quando se baseia em apagar origens. As paisagens do norte da Suécia funcionam como metáfora silenciosa da vastidão e do isolamento enfrentados por Elle-Marja, reforçando a reflexão sobre identidade, escolha e memória.
Família, memória e reconciliação
A jornada da protagonista se estende até a idade adulta, quando o retorno ao funeral da irmã a confronta com o passado e suas escolhas. Esse reencontro com memórias reprimidas oferece um espaço para reflexão e, possivelmente, reconciliação com sua própria história. Kernell constrói a narrativa de forma intimista, usando alternância de tempos e linguagem visual naturalista para transmitir emoção e realismo.
A presença da família, mesmo marcada por rupturas, revela a complexidade da identidade indígena frente à opressão estrutural. Cada gesto, olhar ou silêncio é carregado de significados, mostrando que a história de um povo e de seus indivíduos não pode ser apagada, mesmo quando se tenta fugir das origens.
