dirigido por Fredrik Gertten: uma crítica contundente ao modelo urbano que prioriza veículos particulares em detrimento da qualidade de vida coletiva. Filmado em metrópoles como São Paulo, Los Angeles, Toronto, Copenhague e Bogotá, o longa é mais do que um retrato de trânsito caótico — é uma investigação sobre como nossas escolhas de mobilidade moldam, silenciosamente, o tipo de sociedade que construímos.
A cidade refém de quatro rodas
Ao longo de décadas, as grandes cidades se adaptaram à lógica do automóvel. Viadutos, avenidas expressas, estacionamentos em massa: o espaço público foi redesenhado para servir à velocidade e ao consumo individual, frequentemente à custa de áreas verdes, calçadas seguras e espaços de convivência. O documentário expõe como essa priorização ampliou problemas que hoje consideramos crônicos — poluição atmosférica, congestionamentos intermináveis, exclusão espacial e aumento do sedentarismo.
Em meio a esse cenário, surge um embate silencioso: quem pode, de fato, ocupar a cidade? A resposta, até recentemente, parecia favorecer quem dirige. Mas a ascensão dos ciclistas urbanos, dispostos a reivindicar seu direito de ir e vir com segurança e respeito, está reconfigurando esse mapa de privilégios.
Bicicleta: mais que transporte, um ato político
Em Bikes vs Cars, pedalar não é apenas uma questão de escolha pessoal. É uma ação política cotidiana que desafia estruturas consolidadas de poder. Em cidades como São Paulo, ciclistas relatam a constante sensação de vulnerabilidade: ruas sem infraestrutura adequada, desrespeito dos motoristas e uma cultura urbana que ainda vê o carro como símbolo de status e sucesso.
Ao destacar histórias de ativistas que arriscam a vida para defender um novo modelo de cidade, o documentário evidencia a bicicleta como instrumento de transformação social. Trata-se de devolver às pessoas o direito a espaços urbanos mais justos, seguros e humanos — algo que vai muito além da mobilidade.
O poder invisível: indústria e lobby
Por trás da prevalência dos carros está uma força invisível, mas poderosa: o lobby automobilístico e petroleiro. Bikes vs Cars revela como campanhas publicitárias, pressões políticas e investimentos milionários moldaram políticas públicas ao redor do mundo, favorecendo o transporte individual motorizado em detrimento de alternativas coletivas e sustentáveis.
A relação entre interesses econômicos e decisões urbanísticas explica, em parte, a resistência histórica à expansão de ciclovias, faixas exclusivas de ônibus e zonas de baixa emissão de carbono. Em muitos casos, essas alternativas são tratadas como ameaças ao status quo — e não como soluções para um futuro urbano mais equilibrado.
Modelos que inspiram: o caso de Copenhague
Se de um lado o documentário expõe realidades alarmantes, de outro oferece esperança. Copenhague é apresentada como exemplo de cidade que abraçou a bicicleta como eixo central de seu planejamento urbano. Lá, mais da metade da população pedala diariamente para trabalhar ou estudar, resultado de décadas de investimentos em infraestrutura segura e campanhas de conscientização.
O contraste com cidades como São Paulo e Los Angeles, onde o carro ainda reina soberano, revela que a transformação é possível — mas exige vontade política, participação cidadã e a coragem de reimaginar o espaço público.
Cidades para pessoas: uma necessidade urgente
Bikes vs Cars convida o espectador a repensar uma pergunta fundamental: para quem, afinal, as cidades devem ser feitas? Ao acompanhar a luta diária de ciclistas anônimos e ativistas engajados, o filme defende um modelo urbano mais inclusivo, saudável e resiliente.
Garantir acesso igualitário aos meios de transporte, promover modos de deslocamento que reduzam as emissões de poluentes e valorizar a convivência no espaço público não são apenas escolhas estéticas ou de estilo de vida. São caminhos estratégicos para enfrentar os desafios ambientais, sociais e de saúde pública que marcam o século XXI.
Mobilidade como direito, não como privilégio
Ao final da jornada proposta por Bikes vs Cars, uma mensagem ecoa com força: mudar nossa maneira de nos movermos é, também, mudar a maneira como vivemos juntos. Construir cidades que priorizem pessoas — e não máquinas — é um passo essencial para tornar o futuro mais justo, sustentável e democrático.
E talvez, ao ocuparmos novamente as ruas com nossas bicicletas, também estejamos pedalando rumo a uma sociedade mais humana.